quarta-feira, 25 de maio de 2011

Quem tem medo de nomenclatura?

Se eu tenho jeito para escrever, desenrolei isso com a minha mamadi, mas não me cansarei de agradecer diariamente ao meu pai por ter sido tão irônico tantas vezes ao longo dos nossos quase 16 anos de convivência. As ironias finíssimas que ele soltava acabaram por aguçar a percepção que minha irmã e eu temos das coisas. Minha sis herdou o raciocínio lógico ultrarrápido - tipo... eu gosto de assistir a filmes de suspense com ela, porque ela sempre saca as coisas antes de  mim e, achando tudo muito óbvio, solta o mistério com desprezo; eu, com inveja, sempre concordo como se também já tivesse sacado aquilo há séculos! :P Mas bem, ela herdou o raciocínio lógico e acho que eu fiquei com o feeling para entender as palavras. Modéstia à parte, estamos ambas bem servidas, creio. :)

Então o que me aconteceu foi: quando meu pai me ensinava matemática fazendo questão de que eu compreendesse cada uma das palavras dos enunciados, acabei automatizando esse hábito e, ao deparar com palavras estranhas como adjunto, adnominal, adverbial, oração subordinada, oração coordenada, assindética, etc., dificilmente eu me assustava, porque quase tudo era bem lógico pra  mim.

Escolhi, então, algumas nomenclaturas que costumam apavorar as pessoas na hora da tão temida análise sintática. ;) Não vou "dar aula" de análise sintática, tá? Só vou tentar explicar, porque, por mais que a maioria de nós não vá mais usar essas nomenclaturas, não custa entender, né? E, também, acredito que isso pode ajudar os concurseiros de plantão. ;)

*Gláucia, perdoa esta discípula, perdoa!? :)

Bora lá!
As nomenclaturas escolhidas para hoje foram:
  • predicado / predicativo / verbo de ligação
  • adjunto adnominal / adverbial
Depois eu trago mais. :)

Predicado, predicativo e verbo de ligação

Quando estava com meus pirralhos, fazia questão de que eles vissem o significado de "predicar" no dicionário. No geral, eles entendiam que "predicar" era "dizer algo sobre alguém ou alguma coisa" e, assim, não ficava mistério sobre a função do predicado dentro das orações: dizer algo sobre o sujeito, por meio de um verbo, de uma maneira bem abrangente.

Era bem tranquilo, para os pirralhos, encontrar o núcleo do predicado quando os verbos eram "de ação". Mas meus amados sofriam quando chegavam os tais verbos de ligação e a parte mais importante do predicado não era mais o verbo, mas o que eles passariam a chamar de predicativo.

Aí eu lembrava a aula do dicionário e sacava de novo o livrinho para eles relerem o que era "predicar", só pra lhes refrescar a memória. Depois, expunha no quadro o poema Irene no céu, de Manuel Bandeira:
Irene no Céu
Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Imagino Irene entrando no céu:
- Licença, meu branco!
E São Pedro bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
Chamava a atenção deles para a primeira estrofe e perguntava o que ela queria dizer. Sem pestanejar, eles diziam: "Tia, ele quis dizer que Irene é preta, Irene é boa e Irene está sempre de bom humor." E muitos, com euforia, entendiam por que os verbos de ligação são chamados assim, afinal, eles são quase sempre desnecessários para a compreensão da ideia, já que, muitas vezes, podemos suprimi-los e o que queremos dizer sobre o sujeito não ficará comprometido. Ele serve, então, para ligar o sujeito àquilo que se diz, de fato, sobre ele: preta, boa, sempre de bom humor.

Depois, ficava mais fácil compreender por que esse tipo de predicado era chamado de nominal: a parte mais importante era sempre o nome (substantivo, adjetivo ou pronome) que era dito sobre o sujeito, não o verbo em si.

Nesse momento, sempre há quem levante a questão: "Mas como assim o verbo não interessa? Dizer que alguém está bonito não significa dizer que ele é bonito. Aí o verbo importa, sim!" Ora pois! :) Isso é verdade, mas convenhamos que o foco não é "ser sempre" ou "estar", né? No momento dessa interlocução, o que se quer frisar é a beleza da pessoa naquele momento, independente do passado ou do futuro.

Só sei que, assim, chegávamos à compreensão do que era o predicativo: ele não é O predicado porque não compreende o verbo, mas é quase isso, pois é aquilo que se diz, de fato, sobre o sujeito. (Estou ignorando, aqui, o fato de existirem os predicados verbo-nominais e os predicativos do objeto, tá? Afinal, a ideia é entender por que chamamos de predicativo.)

Se o verso de Bandeira fosse "Irene é preta", teríamos:
    • Sujeito: Irene
    • Predicado: é preta
    • Verbo de ligação: é
    • Predicativo: preta
:)


Adjunto adnominal / adverbial

Tem gente que resolve estudar Engenharia porque não entende português, mas entende um triângulo retângulo, por exemplo:



Perdoo os meus pirralhos da 6ª série (7º ano) que não entendem os triângulos retângulos, porque acho que isso só é estudado na 7ª série, ou no final da 6ª, bem depois de eles começarem a estudar análise sintática.

Na Geometria, sabemos que os triângulos retângulos são aqueles que possuem um ângulo reto (90º). Os lados desses triângulos têm nomes, como também sabemos: os lados que formam o ângulo reto são carinhosamente chamados de catetos; o lado oposto ao ângulo reto, por sua vez, é carinhosamente chamado de hipotenusa. Ninguém pergunta por que se chama "cateto" ou "hipotenusa", né? A nomenclatura desce goela abaixo e ninguém reclama. Ninguém reclama, também, de precisar decorar que os outros dois ângulos são sempre formados por "um cateto adjacente + hipotenusa"... O_o

Se os professores de matemática, de uma maneira geral, também estivessem preocupados com a língua, acredito que o pavor de muuuita gente seria diminuído. Ora, ora, vamos lá.

Os catetos são chamados de adjacentes somente quando o ângulo em questão é aquele que eles ajudam a formar com a hipotenusa. São adjacecntes porque, em latim, o prefixo ad- significa aproximação. Logo, se o ângulo de que eu quero falar é o ângulo α, exposto lá em cima, eu devo considerar o cateto que lhe serve como um dos lados para a composição do ângulo. ;)

Em análise sintática, os termos chamados de adjunto não poderiam seguir outro raciocínio. ;) Se ad- significa "próximo" e "junto" significa "junto", então os adjuntos são aquelas palavras que vêm junto de outras para lhes acrescentar alguma informação. São, em sintaxe, o que consideramos como determinantes de um dado núcleo (palavra principal); são as palavras que rodeiam esse núcleo para especificá-lo mais. Adnominal serve para os nomes (substantivos, pronomes); adverbial, para as palavras que os advérbios costumam qualificar (verbo, advérbio, adjetivo).

No período "O pato pateta pintou o caneco", identificaríamos:
    • Sujeito: o pato pateta
    • Adjuntos adnominais: o / pateta
      • Isso porque eles determinam quem é o pato, especificam esse substantivo nuclear pato.
    • Predicado: pintou o caneco
      • Aqui, no predicado, temos outro substantivo: caneco, que também tem um adjunto adnominal: o
No período "Caiu no poço" (o mesmo pato pateta de Toquinho), teríamos:
    • Sujeito oculto: ele (o pato pateta)
    • Predicado: Caiu no poço
    • Adjunto adverbial: no poço
      • "no poço" é uma locução adverbial, porque tem valor de advérbio (de lugar). Nas orações, as classes gramaticais deixam de ser classificadas como classe e recebem funções. No caso dos advérbios, eles assumem a função de adjuntos adverbiais.
Esse raciocínio é sobre as nomenclaturas e acaba só servindo de base para os raciocínios futuros, porque, em períodos mais elaborados, mais complexos, os "adjuntos" adverbiais podem vir beeem separados do predicado, mas isso não desmente ou desvaloriza a nomenclatura, ok? :)

1 comentários:

Cecília Freitas disse...

Esse post poderia ter vindo amanhã (26/05) já que tu cita painho ;)

Lembro perfeitamente do exemplo que ele deu de ângulos adjacentes!!! Acho que era 6ª série.
Dava óóóódio! hahahahha

Falando em painho, matemática... lembrei de uma história. A gente lá no sítio, aí chego com uma tarefa de matemática pronta e peço pra tu corrigir. Depois de muito tempo tu chega "essa letra é o número 5", e eu fiquei sem entender. Quando vejo... tu não tinha entendido a minha letra e pensava que o meu 5 era um S e que o objetivo deu ter te dado meu caderno era resolver a equação hahahahaha Eu fiquei abismada como tinha conseguido descobrir que aquele S era um 5 HAiuhAUhauhAIUHaiuh

Postar um comentário

Se nós não nos conhecemos ainda, por favor, informe seu e-mail ao final do comentário ou me envie um e-mail para anocaa@gmail.com, para que eu possa entrar em contato depois.

Obrigada,

Ana.